Carlos Rodrigues Brandão
Tantos anos depois…
Bem que eu gostaria de começar este apanhado ao acaso de memórias e
depoimentos sobre não tanto a obra, mas a pessoa de Paulo Freire, tratando quem
me leia como ele costumava falar. . Paulo usava o “tu”, das pessoas de fala
espanhola, dos gaúchos, das paraenses e de mais alguns brasileiros, inclusive do
Nordeste. Assim ele deixava de lado o “você”, tão mais nosso, e ao falar nos
olhava na cara e dizia: “Tu, Carlos, tu, o que pensas sobre isto?”
O que desejo partilhar com vocês são algumas memórias minhas e alguns
depoimentos a respeito da “Pessoa de Paulo”. Pequenos fatos, alguns triviais e
quase pitorescos, outros mais sérios, mas sempre pouco acadêmicos e ortodoxos.
Convivi com Paulo Freire apenas após seu retorno do exílio. Convivi com
suas ideias desde muito antes, quando trabalhava como educador popular no
Movimento de Educação de Base e era um “militante engajado” na Juventude
Universitária Católica.
Entre voos (alguns longos), viagens por terra, salas de aulas, locais amplos
de encontros, congressos e semelhantes, ou mesmo ao redor de uma mesa de
bar, nós compartimos horas e horas da vida. O que trago aqui é a memória de
fatos e o depoimento de feitos deste homem que de tanto ser lembrado como um
militante da educação, um professor e um escritor de livros que ajudaram o mundo
a ser melhor e mais consciente de si-mesmo, acabou sendo quase esquecido de
ser também uma pessoa que numa mesa de bar, ou em uma viagem de avião,
gostava de conversar muito sobre a vida… e muito pouco sobre a educação.
Não pretendo de modo algum escrever aqui um “livro para ser publicado”.
Quando ele ficar pronto eu o vou enviar a um ramalhete de pessoas amigas. E
desde já gostaria de desafiar aquelas que, como eu, algo tivessem a narrar a
respeito da “Pessoa de Paulo”, que se animassem a somar aos meus, os seus
depoimentos. E, às minhas, as suas memórias compartidas.
O próprio Paulo gostava muito de se autobiografar em momentos de seus
livros. No entanto, observem que são mais memórias de infância e juventude do eu
as de quando já era “o professor Paulo Freire”. De resto, em suas inúmeras
biografia há muitos momentos de suas memórias. Sem falar na completa e
excelente biografia de Paulo escrita por Ana Maria Freire. Faltam, no entanto,
“depoimentos de vida” que em diferentes situações nos ligar a este homem
irrepetível.
A ordem do que escrevo essas doze narrativas é ao acaso e não observa
cronologia alguma.
Campinas, outono de 2018
Carlos Rodrigues Brandão